REDAÇÃO
CAPÍTULO XV
CARTA
ALDRY
SUZUKI AMO VOCÊS!!
1-
Introdução
A carta é uma modalidade
redacional livre, pois nela podem aparecer a narração, a descrição, a reflexão
ou o parecer dissertativo. O que determina a abordagem, a linguagem e os
aspectos formais de uma carta é o fim a que ela se destina: um amigo, um
negócio, um interesse pessoal, um ente amado, um familiar, uma seção de jornal
ou revista, etc.
Estética
A estética da carta varia
consoante a finalidade. Se o destinatário é um órgão do governo, a carta deve
observar procedimentos formais como a disposição da data, do vocativo (nome,
cargo ou título do destinatário), do remetente e a assinatura.
No caso das correspondências
comercial e oficial – textos jurídicos, comunicadeos, ofícios, memorandos
emitidos por órgãos públicos -, a linguagem é muitas vezes feita de jargões e
expressões de uso comum ao contexto que
lhes é próprio.
Quando um exame vestibular
sugere uma carta como proposta, o aspecto formal, bem como a abertura e o fechamento do texto segundo o
jargão, é irrelevante, pois o que prevalece é
o conteúdo e a linguagem.
Quando um exame vestibular
sugere uma carta como proposta, o aspecto formal, bem como a abertura e o
fechamento do texto segundo o jargão, é irrelevante, pois o que prevalece é o
conteúdo e a linguagem.
O
gênero epistolar na literatura
É preciso enfatizar que uma
obra literária pode apresentar a forma de carta sem, contudo, pertencer ao
gênero epistolar, como é, por exemplo, o caso de Lucíola, de José de Alencar: a
história é narrada através de cartas dirigidas a uma senhora, o que não
descaracteriza a obra como romance.
Há exemplos famosos de
correspondências apreciativas ou críticas, como as de Machado de Assis, Eça de
Queirós, Mário de Andrade e outros escritores.
Entre as cartas
doutrinárias, temos as religiosas, como as epístolas de São Paulo, e as
políticas, como algumas cartas do Padre Antônio Vieira.
Veja como Álvaro de Campos
dá sua versão jocosamente poética das cartas de amor.
Todas as cartas de amor
são
Ridículas.
Não seriam cartas de
amor se não fossem
Ridículas.
Também escrevi em meu
tempo cartas de amor,
Como as outras,
Ridículas.
As cartas de amor, se
há amor,
Têm de ser
Ridículas.
Mas, afinal,
Só as criaturas que
nunca escreveram
Cartas de amor
É que são
Ridículas.
Quem me dera no tempo
em que escrevia
Sem dar por isso
Cartas de amor
Ridículas.
(Todas as palavras
esdrúxulas,
Como os sentimentos
esdrúxulos,
São naturalmente
Ridículas)
(Fernando Pessoa/
Álvaro de Campos)
|
Cartas
de amor
Carta de amor –
love letter – Liebesbrief
Tipo de mensagem de
conteúdo estético e muito redundante que constitui uma parte
notável das relações interindividuais.
A carta de amor é o
exutório do tímido, o desabafo do apaixonado, a confissão simples de um ser
que nutre um sentimento por um outro ser, em geral do sexo oposto. A
originalidade desta carta reside na pobreza do conteúdo semântico dos temas
desenvolvidos: a mensagem é sempre a mesma; quer-se provar e dizer que se
ama. Este estilísticos diferentes, com imagens, comparações que, bem
frequentemente, giram no vazio. Nela, as noções de percepção e de
subjetividade são importantes. Se o destinatário da carta de amor compartilha
os sentimentos do autor, vai ler um texto irrepreensível e envolvente: o conotativo
toma conta de tudo. Se, por acaso os sentimentos não são compartilhados, a
carta será julgada com rigor e será considerada banal, vazia e sem valor
literário ou afetivo. O indivíduo rejeita o conteúdo de uma mensagem , no
sentido concebido pelo remetente, que ele não deseja receber.
A carta de amor é,
então, um sistema informativo, situado no
quadro de uma comunicação bilateral, se a densidade de sentimentos
compartilhados for igual de ambas as partes. Uma carta de amor entendida como
uma comunicação unilateral arrisca-se a representar uma verdadeira catástrofe para seu autor,
catástrofe sentimental e afetiva, que pode muitas vezes ter consequências
drásticas por toda sua vida. Tudo isto, unicamente porque o indivíduo crê
oferecer uma dádiva e não admite, em todos os sentidos, e com todas as
nuanças psicológicas implicadas pelo ato que ele empreende, que alguém possa
recusar esta dádiva (dádiva de si que também pode ser um desejo latente de
posse do outro).
A carta de amor
torna-se uma instituição social, na medida em que não se pode, ou não se
deve, declarar a paixão apenas oralmente.
Declará-la por escrito
é mais sério e permite melhor ao outro
imbuir-se da importância da mensagem emitida. (1)
Entretanto, a carta de
amor, cara aos românticos, tende a rarear, correlativamente ao
desenvolvimento da comunicação de todas as espécies, principalmente o
telefone e os transportes rápidos (veículos automotores, aviões).
O amor, nos romances e
filmes modernos , não mais se baseia em troca de correspondência: o herói
apaixonado, para declarar sua paixão ou dar uma prova de amor, salta num
avião, põe-se ao volante de seu carro ou envia um telegrama.
(Abraham Moles)
|
(1)
Paradoxalmente, esta carta que une os seres
contribui para sua separação, quando num divórcio, serva para um dos cônjuges
provar que o outro tem sentimentos ou relações culposas com um terceiro.
Primeira carta
Vê lá, meu amor , como
foste incapaz de adivinhar o que iria acontecer... Ah, mentirosas esperanças, me enganaste...
Uma
paixão que te merecera tantos projetos de ventura só te dá agora um enfado
mortal que apenas se pode comparar em crueldade à ausência de que ele mesmo é o causador.
Pois quê? Este desterro a que minha dor, por mais engenhosa, não sabe que
triste nome dar, há de privar-me para
sempre desses olhos em que eu via tanto amor, e que me fazia desfalecer, e
que me enchiam de júbilo e que para mim valiam mais do que tudo, e que,
enfim, me bastavam? Coitada de mim! Os meus é que perderam a única luz que os
animava, e só lhes restam lágrimas, que outro emprego lhes não tenho dado
senão chorar noite e dia desde que soube que estavas resolvido a um
apartamento que não posso aguentar e que me fará morrer em pouco tempo.
Adeus, não me atrevo a
deixar este papel que vai estar nas tuas mãos e queriria ter a mesma deia.
Ai, que desvairada ando! Como se não soubesse que tal não é dado. Adeus,
falta-me ao ânimo. Adeus.
Ama-se sempre e faz-me padecer
ainda mais.
(Mariana
Alcoforado)
|
As cartas amorosas de
Mariana Alcoforado, uma freira portuguesa que se apaixonou por um oficial
francês, são um bom exemplo desse estilo de cartal.
Essas cartas foram
publicadas na França e depois em alguns tempo traduzidas para o português, em
Portugal.
O arrebatamento passional,
romântico, característico do texto assinado pela Mariana alcoforado, põe em
relevo a função emotiva da linguagem. A dor da separação, o apego à memória da
pessoa amada e a autocomiseração dimensionam a paixão da autora.
A palavra paixão, cujo étimo
é pathos
(sofrimento), encontra nas cartas de amor de Mariana Alcoforado sua expressão
maior. Observe que a abordagem cerimoniosa é determinante do contexto barroco.
Querido José
Escrevo-te estas poucas
linhas para recordar o passado entre nós dois, José desde aquele dia em que
me encontrei com você na Praça Tiradentes e depois não veio mais falar
comigo, eu fiquei muito triste mas não deixei de pensar em ti, o amor que eu
tenho por você nunca tive por outro moço, só por você mesmo e se não fizer
vida junto contigo eu não quero saber de mais ninguém porque só quis você na
minha vida, pense um pouco em mim por favor, me perdoe por tudo o que eu te
fiz, mas foi sem querer, e peço que venha falar comigo, que daí nós se
acertamos, eu quero ser feliz com você, é triste gente andar como cigana, jogada de um canto
a outro, estarei morta para teu coração? Já esqueceu de mim por outra? Espero
que não, pois ainda te amo, a toda momento vejo tua imagem querida como se
estivesse de guarda no espelho, não se faça de rogado José, eu também não
estou muito boa, estivesse com dor de
garganta, te espero sem falta, não seja assim ingrato, sendo você um coração
de pedra não sabe corresponder a este amor desprezado, não engane este
coração fraco de uma coitada que tanto sofre no mundo, sinto-me triste e
aborrecida, era assim que dizias que me querias bem, mas não parece José,
desde aquele dia estou sozinha, apanhei do outro na cara, mas graças a Deus
ele se retirou da minha vida, José a traição que te fiz você poderá
perdoar-me, hoje eu sei que se vivesse num castelo nada disso me agradava ,
quero ficar ao teu lado para ser um pouco feliz, não tenho sossego longe de
você nem durmo de tão desgraçada , José esta carta
é cheia de erros mas, é
uma carta de amor, sua tua na expressão da verdade.
Maria.
(Dalton Trevisan)
|
Dalton Trevisan, incorporando comportamentos e linguagem de
tipos humanos comuns, estende-se do vulgar ao grotesco, revelando a
simplicidade, a leviandade e os valores humanos que tipificam seus personagens,
inspirados no cotidiano menor. Observe que a linguagem dessa carta amorosa evidencia
a incompetência linguística da remetente. A limitação expressiva vem indicada
na ausência da pontuação, no emprego dos pronomes, nos tempos verbais e na
acentuação. A súplica pelo reatamento, pelo retorno urgente, o pedido de
perdão, a saudade, as alterações de comportamento e a saúde debilitada
concorrem para expor a inquietação emocional da autora.
Ismênia, moça donzela.
1.
Saudações .
Dr.Antônio, desculpe a
ousadia de escrever-lhe, mas é que ontem fiquei arrependida de não confessar
a paixão que sinto, porque tive a vergonha, e mesmo vejo que o senhor é
casado e pai de tantos filhos, mas acho que isso não tem importância, porque
hoje em dia a gente sabe de tanta mulher casada gostando do homem de outra,
quanto mais eu que sou moça donzela, a diferença é que não sou correspondida.
O Dr. Venha hoje na
mesma hora de ontem falar comigo, que eu espero no portão e mamãe não vai nos ver. Se o
senhor não vier é sinal que não tem a mínima simpatia por mim.
Sem mais, sua criada
obrigada.
Ismênia.
P.S. Desculpe os erros
porque estou um pouco nervosa.
|
2.
Querido Antônio.
Eu te escrevo este
bilhete porque não posso suportar este amor. Olha, Antônio, se você quiser,
de hoje em diante eu te farei os desejos, mas só se você me estimar como tua
amante, e não me deixar faltar nada e nunca me abandonar.
Eu te espero hoje, às
três horas, no mesmo lugar de sempre. Eu não quebro o juramento que fiz, mas
você não sei, Antônio.
Da sempre fiel,
Ismênia.
P.S. De há muito pedi o
teu retrato, será que serei merecedora? Tenho andado doente do estômago, é
tudo por causa do nosso amor. Se for possível, mande-me qualquer importância
pelo menino para comprar algum remédio. Sonhei a noite toda que me traías e
não me querias mais, será?
|
3.
Estimado
Antônio.
Saudações.
Esta
carta será a última que minha mão e escreve. Eu acreditei no que você disse a
semana passada, mas como choveu enfim teve desculpa, mas hoje está uma noite
bonita, e eu te esperei até às nove horas, como você não veio então eu sei que sou desprezada.
Ou
você não apareceu por mamãe não querer sair da sala? Se foi por isso ela pode
esperar fechada lá na sala? Se foi por
isso ela pode espera fechada lá na cozinha. Não se faça de rogado.
Antônio, mas que horror depois de tudo que foi combinado você ficar
arrependido, venha sim: Não tenha preguiça, eu te peço pela segunda vez.
A
que há de ser tua.
Ismênia.
P.S.
Peço por obséquio de enviar pelo menino algum dinheiro, que estou apurada para pagar uma conta e a pessoa está esperando aqui.
|
4.
Antônio.
Te
peço por esmola, já que você não quer o meu amor, que me mande qualquer
importância para eu dar por uma prestação, que o turco veio aqui com
desaforo, e eu estou louca de tristeza.
Olha,
Antônio, estou resolvida a ser tua de corpo e alma, e não quero que você me
dê nada de roupa nem comida, só o aluguel da casa, eu já fico satisfeita, e o
resto Deus há de dar forças para mamãe trabalhar, só queria que você me desse
o aluguel da casa.
Venha
de noite que eu te espero, hoje, hoje, hoje. A que será tua.
Ismênia.
P.S. Falei com a Mamãe e ela está de acordo.
|
5.
Querido Antônio.
Eu estou completamente triste, só pensando
nesta vida amarga, nós fizemos o trato de eu ser tua, e você me ajudava um
pouco, agora você faz oito dias hoje que não me aparece, então eu acho que se
arrependeu e não me quer mais.
Sou ainda a mesma.
Ismênia
P.S. Um pequeno favor eu te peço, você me
faça esta caridade de entregar ao menino qualquer importância, que minha mãe
tem de pagar umas continhas que fiz, eu também preciso fazer a extração do
dente, amanhã sem falta.
Desculpe se escrevi a lápis, por causa que
não tinha tinta, anjinho meu.
|
6.
Meu inesquecível Antônio.
Não seja ingrato, não iluda um pobre coração como o meu, você me enganou e não vem matar esta
paixão que sinto no peito, você é mesmo mau, não quer o meu amor, já estamos
a cinco do mês e você só veio duas vezes aqui, não é longe, eu sei que você
esta com raiva de mim.
O que foi que te fiz, Antônio, que você se
tornou tão ingrato? A dona da casa me falou se eu posso pagar , estou
aborrecida porque não queria te incomodar. Ontem passei um dia bem amargo, escrevo
esta cartinha com lágrimas nos olhos, está vendo as letras como estão
borradas?
Olha Antônio, eu quero ser sua inteirinha
tua, e quero que você seja meu também.
Ismênia.
P.S. Desculpe o papel e o envelope, tudo
isto é efeito da crise.
|
7.
Meu inesquecível Antônio.
Hoje estou tão triste, mesmo quase para
desistir da vida, não dormi nada, e só pensando nesta desgraçada sorte minha,
faz seis dias que você não vem aqui, sei que não mereço teu amor, sou humilde
e tu és um Dr. ! Tens o mundo que sorri diante de ti, eu antes pensava mesmo
que você não vinha quando chovia por causa da lama, mas com estas noites
bonitas por que você não vem??
Antônio, resolvi mandar minha mãe falar
com você, para ver se pode me
emprestar algum dinheiro , fiquei muito doente com uma forte gripe e muito
magra, precisei ir ao médico, senão não sei o que seria de mim, ele me
receitou um remédio muito caro, eu estou sem recurso e não posso pagar, se
caso você me emprestar o dinheiro mande por mamãe e se você puder tudo mande
pelo menos um pouco.
Da sempre fiel,
Ismênia.
P.S. Antônio, se quer me ver morta, então é
que você não vem hoje. Não fique zangado comigo, eu por você dou até minha
salvação, quero ser tua de alma e corpo e vida.
|
8.
Saudações.
Queridinho, eu te mando esta cartinha para
saber notícias, pois eu tenho muitas saudades tuas, quero ver se esta semana
vou falar contigo, porque tu sabes que não posso sair de casa por causa de
meu amigo. Eu tenho coisinhas do outro mundo para te contar.
Antônio, desde aquela noite ele não me
deixa sair, até apanhei uns tapas, eu fico esperando no portão, você é e
continua sendo meu primeiro amor, você
ainda há de me perdoar a traição que te fiz.
Não mereço a raiva que tens contra mim, bem
sei que sou inocente, eu fui iludida pela falsa lábia daquele homem e ele
agora está desempregado, eu não tenho mesmo sorte, por favor me mandes algum
dinheiro pelo menino, que eu preciso demais, a tua
Ismênia.
P.S. Meu bem, enfim sempre tenho a satisfação
de avisar-te que ele hoje à tarde não estará em casa, você pode vir sem medo.
Espero-te
às três horas no portão e serei tua , inteirinha tua.
|
9.
Antônio, você pensa que eu não sei que tens
um caso com uma dama casada? Eu te peço pelo amor de teus filhos que não
fales no meu nome para esta sujeita que você arrumou só para prejudicar o
nosso amor, por causa de você ser um homem sem caráter, e o tempo de tratar
de teus negócios como doutor de respeito andas atrás de qualquer uma,
tenho fé nas forças do inferno que
todo o mal há de cari sobre ela e você, que andou se gabando de mim, eu não
esperava que fosses tão ingrato assim, agora que fui abandonada pelo meu
amigo, não sei se sabias que ele me deixou em estado interessante, não tenho
coragem para fazer-te mal, mas espero com resignação que Deus se vingará por
mim, já tive amor por ti, jurei que meu coração puro era só teu, mas o nosso
como tu dizes foi mesmo como o pó que a gente limpa dos sapatos quando chega
da rua, não faz mal porque uma coisa você não pode dizer, que eu tenha sido
tua, pois tua eu nunca fui, era preciso cortar a ponta da tua língua comprida, falador não tens
mais o que falar? Quanto mais velho mais sem juízo, eu te odeio até a morte,
nunca hei de te perdoar de me trocares por uma qualquer, quero mostrar como
se dá o desprezo para um homem, sou feliz e serei até morrer, gozando a vida,
fazendo inveja para você e sem mais aceite um abraço desta que te odeia.
P.S. Não assino porque você nem e digno de
meu nome
(Dalton Trevisan)
|
Análise crítica de
“Ismênia, moça donzela”
De
acordo com a análise de Berta Waldman, “Ismênia, moça donzela” reproduz os
clichês de um “ correio sentimental”, na sucessão de cartas cujo conteúdo
delineia o perfil da heroína signatária ,ora pura, ora carnal:
O clichê objetiva-se tanto ao nível da
construção da história (a moça, o moço, os obstáculos que protelam o encontro),
como nos seus conteúdos (os vilões e malfeitores são punidos, os amantes que
persereram são premiados), como ainda na linguagem em que a narrativa é vazada
(frases feitas, lugares-comuns, diminutivos etc.) (...)
Organizada por meio de uma sucessão de nove
cartas justapostas que sugerem uma sequência temporal, embora não sejam
datadas, a narrativa resulta numa colagem que silencia a voz do narrador para
evidenciar a missiva – Ismênia – implicitamente incumbida da tarefa de relatar
a história de sua relação amorosa com Antônio, o destinatário de suas cartas,
já que da montagem dos textos (tarefa do narrador implícito) se inferem os acontecimentos que os envolvem.
O desaparecimento da voz do narrador coloca
a fala da personagem mais próxima do leitor que fez as vezes de bisbilhoteiro, de interceptor da
correspondência alheia, participando da trama deste tecido como o seu
destinatário último.
Quanto à modalidade de linguagem utilizada ,
percebe-se de parte do autor uma preocupação
em produzir certos elementos constitutivos de clichê de cartas de amor e análogos, ao lado do uso de uma
linguagem mais próxima da moralidade, responsável pela introdução de um
Veio corrosivo de subjetividade, que, no
convívio com o modelo fixo, acaba por agenciar
um descompasso e como decorrência certo tipo de humor ferino.
À guisa de exemplo, segue abaixo uma série
de lexias que alimentam o clichê:
“Eu te escrevo este bilhete porque não posso
suportar este amor” (segunda carta).
“Não seja ingrato, não iluda um pobre
coração como o meu ...” (sexta carta).
“Olha, Antônio, eu quero ser tua, inteirinha
tua...” (sexta carta).
“... jurei que meu coração puro era só teu
... “ nona carta).
“Não seja ingrato, não iluda um pobre
coração como o meu, você me enganou e não vem matar esta paixão que sinto no
peito...” (sexta carta).
“...eu por você dou até minha salvação,
quero ser tua de alma e corpo e vida” ( sétima carta).
“Meu inesquecível Antônio” (encabeçando a
sexta e a sétima carta).
Essas formas, entretanto, são confrontadas
com outras, determinadas por arroubos de subjetividade, marcadas pelo uso
indiscriminado e simultâneo das pessoas de tratamento tu/você, pela utilização
de uma pontuação arbitrária que foge à norma, pela construção de períodos que
reúnem conteúdos variados e díspares, pela utilização do pronome oblíquo que
início da frase e pela escolha de um léxico
e de uma sintaxe próprios de comunicação
oral:
“Olha, Antônio, se você quiser, hoje em
diante eu farei os desejos, mas só se você me estimar como tua amante...”
(segunda carta).
“Ou você não apareceu por mamãe não
querer sair da sala? Se for por isso ela
pode esperar fechada lá na cozinha. Não se faça de rogado, Antônio, mas que
horror depois de tudo combinado você ficar arrependido, venha sim?” (terceira
carta).
“Te peço por esmola, que você não quer o meu
amor, que me mande qualquer importância...” ( quarta carta).
“Antônio, você pensa que eu não sei que tens
um caso com uma dama casada? Eu te peço pelo amor de teus filhos que não fales
no meu nome para essa sujeita que você arrumou só para prejudicar o nosso amor,
por causa de você ser um homem sem caráter, e o tempo de tratar de teus negócios como doutor de respeito andas
atrás de qualquer uma tenha fé nas forças do inferno que todo o mal há de cair
sobre ela e você...” (nona carta).
É na alternância dos dois registros, com o predomínio
crescente do segundo, que as cartas se vão sucedendo e desenovelando o seu
conteúdo básico: a relação amor-dinheiro. Enquanto o clichê alimenta a
mitologia burguesa e remete a outros incumbidos da mesma tarefa, o registro de
linguagem oral remete à degradação do corpo na sociedade capitalista.
(Berta
Waldman)
3.
Carta de Amigo
Com
um propósito informativo e motivada pela intimidade, a carta de amigo e
informal e, muitas vezes, confessional.
Rio de Janeiro, 19 de julho de 1908.
Meu caro
Veríssimo:
Acabo de
receber a sua carta com o seu abraço pelo livro, e venho agradecer-lhe
cordialmente. Sabendo que foi sempre sincero comigo, senti-me pago do esforço
empregado; muito obrigado, meu amigo. O livro é derradeiro, já não estou em idade de folias literárias nem outras.
O meu
receio é que fizesse a alguém perguntar por que não parara no anterior, mas
se tal não é a impressão que ele deixa, melhor. Creio que o compreendi bem,
segundo o que me diz em um ponto da carta.
Eu vou
melhorando, ainda que muito fraco. Saí hoje de manhã , e sairei outras vez se
não chover. O Mário (de Alencar)
tinha-me falado da sua vinda, mas efetivamente era arriscado com tal tempo.
Amanhã conto ir à cidade,se o tempo consentir. Adeus, meu bom amigo,
recomenda-me a todos os seus, e receba em
Troca um
abraço apertado do velho amigo.
(Machado de Assis)
|
Rio de
Janeiro, 7 de setembro de 1908.
Meu querido
Salvador de Mendonça:
A tua boa
carta trouxe ao meu espírito afrouxado não menos pela enfermidade que pelos
anos, aquele alento cordial de juventude, que nada supre neste mundo. É o meu
Salvador de outrora e de sempre, é aquele generoso espírito a quem nunca
faltou simpatia para dias da nossa primeira mocidade. Íamos entrando nos
vinte anos, verdes, quentes e ambiciosos. Já então nos ligava a ambos a
afeição que nunca mais perdemos.
Aqui
estás o mesmo de então e de sempre. A tua
grande simpatia achou a velha da tradição itaboraiense para dizer mais
vivamente o que sentiste do meu último livro (Memorial de Aires). Fizeste-o
pela maneira magnífica a que nos acostumaste em tantos anos de trabalhos e de artista. Agradeço-te, meu
querido. A morte levou-nos muitos daqueles que eram conosco outrora; possivelmente a vida nos
terá levado também alguns outros, é seu costume dela, mas chegado ao fim da
carreira é doce que a voz que me alente seja a mesma voz antiga que nem a
morte nem a vida fizeram calar.
Abraça-te cordialmente o teu velho amigo.
(Machado de Assis)
|
Observe,
nessas cartas, dirigidas a amigos, o tom amistoso e fraterno. A linguagem é
harmoniosa e precisa.
Há
que se observar a lisura machadiana, bem como seu pessimismo risonho e sua
peculiar ironia. Dentro dos padrões atuais, essas cartas seriam consideradas
anacrônicas, não só0 por sua abordagem obsequiosa, como também pela incomum afetividade
que, modernamente, seria recebida como afetação (“meu querido”).
4.
Carta familiar
É
também a intimidade que caracteriza a carta familiar. Sua linguagem varia
conforme o grau de parentesco e a época em que se insere. A confissão igualmente
motiva o contato familiar, abrindo-se, inclusive, para a irreverência
humorística.
São
Paulo, 12 de agosto de 1851.
Minha
irmã
No dia de
teus anos, que queres que eu te diga??
Que os anos de virgem são como as manhãs de flores? E que, na aurora da vida,
flores e donzelas , cintilantes do orvalho de Deus, têm mais pureza e
perfume? Não.
Dir-te-ei
somente uma coisa – É que lá no Rio Vale talvez a pena fazer anos. Nunca
tarde de primavera e de esperança, vivendo e sentindo-se, é doce por ventura
sentir que mais uma no passou como um sonho, mais um ano de saudade e
felicidade.
Aqui não
acontece assim- O céu tem névoas, a
terra não tem verduras, as tardes não têm perfumes. É uma miséria! É para
desgostar um homem toda a sua vida ver ruínas. Tudo aqui parece velho e
centenário... até as moças são insípidas como a mesma velhice!
O dia 12
de setembro está para chegar. Estou quase não fazendo anos desta vez.
Adeus,
minha irmã, a página nova da vida que se abriu hoje, seja tão feliz como a
que se fechou ontem. O dia seja belo como outrora, o futuro tão suave como a
saudade é doce. Adeus!
É a
palavra que dentre as coisas em ruínas da nossa terra te envia o teu irmão de
coração.
(Azevedo)
|
Pieguismo
e derramamento afetivo cruzam-se nessa carta de Álvares de Azevedo, cuja
linguagem seria considerada anacrônica, artificial e ultrapassada diante dos
padrões modernos. O perfil da irmã aniversariante é impregnado de lirismo e
imagens grandiloquentes que pontificaram a literatura ultrarromântica. A
valorização da juventude, do belo, da donzelice, do sentimento de exílio, da
saudade é traduzida metaforicamente nos trechos grifados.
Carta de Micael dos Reis a um primo de São José
do Monte, o mecânico Manuel Bastos.
Manequinho,
não precisa mandar mais carta para a oficina de lanternagem de Zuzu Tavares,
uma vez que mudei de ofício e abracei a carreira de escultor moderno. Sei
como o pessoalzinho de São José do Monte vai rir ao saber que o filho de Santinho Reis está fazendo nome a poder
de ferro-velho e coisa distorcida. Peguei inclinação pelo ramo no dia em que
vi nos jornais um para-lama de sucata que pegou o primeiro prêmio numa demonstração de esculturagem no estrangeiro
e mais depois em São Paulo . Aí, primo, meti os peitos.
Nem
retirei o macacão de lanterneiro. E de macaçaõ, todo lambuzado de óleo e sujo
de graxa, pulei para o negócio de lata velha. Peguei de jeito uma porta de
automóvel, meti o maçarico nela, furei
e bordei. Em, seguimento, lasquei por cima uma pá de ventilador e arrematei a
obra com uma porta de automóvel, meti o maçarico nela, furei e bordei. Em seguimento,lasquei por cima uma pá de
ventilador e arrematei a obra com uma antena de televisão. Parti para o IV
exposição da Primavera com esse trabalho que chamei de
Vento
outonal nas Rosas do meu Coração. Não tirei o primeiro lugar porque um
cretino teve a ideia genial de aparecer com um fogão econômico de 1917
soltando fumaça por todos os buracos. Começo e fim da criação , como era o
nome do dito fogão econômico, venceu de ponta a ponta. Uma dona ficou tão
esfogueteada que comeu três quilos de
fumaça e foi esvaziar o estoque no hospital. Em todo o caso, meu Vento
Outonal tirou o segundo posto e uma braçada de palmas nos jornais. Agora , na
próxima vez, vou aparecer de macacão,
barba escorrida no peito e de boné listrado na cabeça, de modo a ficar nas
evidências do mundo. Vou entupigaitar a praça com o Jarro do Barão, um penico
que muni de uma trombeta de gramofone e um vidro de magnésia leitosa. Primo,
em matéria de invencismo eu sou fogo selvagem. E para despedir, recomendações
aos tios, principalmente um grande abraço na prima Noca. E não deixe de ver
se compra em São José do Monte e redeondezas uma caixa de descarga anti
pretendo concorrer a uma exposição na
Bahia que vai render uma nota bonita. Um
caixa desse tipo não é só folclorítica
como fotografática. Calha muito bem em recantos de sala de visitas por
baixo daqueles retratos de família em feito oval.
(José Cândido de
Carvalho)
|
A
intimidade de linguagem e o teor confessional da carta descambam para o humor
satírico , compondo uma crítica descambam para o humor satírico, compondo uma
crítica debochada da arte.
Em sua
linguagem figuram neologismos, como “ invencismo”, “folclorítica”, e “fotografática”, e palavras recolhidas na
linguagem popular, como “entupigaitair”.
Expressões como “ mais depois em São Paulo”, “meti os peitos” e outras dão a
tônica intimista e espontânea que uma carta pessoal caracteriza.
Debochadamente,
o autor destila uma crítica cortante aos
valores estéticos e sua implicações de gosto, quando prevê o sucesso de suas
bizarras esculturas modernas.
5.
carta de cerimônia
A
correspondência cerimoniosa deve garantir a mesura protocolar que se exige no
contato com órgãos públicos e seus altos escalões. Seu discurso, que pode
afigurar-se pedante ou bacharelesco, só se justifica em situações de
formalidade.
Ajuda, 2
de janeiro de 1851.
Ilmo, Sr. Secretário da Academia Real das Ciências de Lisboa:
Não consentindo a distância de minha residência
à sede da Academia Real das Ciências
que eu assista às suas sessões literárias, ao passo que as minhas muitas
ocupações obstam a que de outra qualquer
maneira cumpra com as obrigações acadêmicas, sou, por força maior, um
membro inútil da mesma Corporação.
Nestes termos, eu rogo a V. Exa. Que,
apresentando este ofício na primeira sessão de efetivos, peça, do modo mais
positivo, e, se tanto for necessário, exija que o meu nome seja riscado do catálogo dos sócios da
Academia Real das Ciências de Lisboa.
Espero dever à urbanidade de V. Exa. a particular mercê de comunicar a resolução
dessa assembleia, que por nenhum princípio pode ser contrária às minhas instantes solicitações.
Deus
guarde a V. Exa.
(Alexandre Herculano)
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Temos
aqui um exemplo de carta cerimoniosa, essencialmente informativa, portanto
referencial. O pronome de tratamento “V. Exa.” e a linguagem sóbria correspondem
à formalidade do contexto ( o afastamento das obrigações acadêmicas) e a
entidade envolvida (Academia Real das Ciências de Lisboa).
6.
Carta no vestibular
Vestibulares
como os da Unicamp e Unesp, no Estado de São Paulo, oferecem ao candidato a
possibilidade de optar por uma carta. Sua abordagem é dissertativa e, portanto,
deverá ser fundamentada por meio de evidências, juízos, exemplos – que poderão
ser narrativos ou descritivos – admitindo a expressão em primeira pessoa.
Assim,
qualquer que seja o assunto ou tema proposto, encaminhará o candidato à defesa
de um ponto de vista que deve ser exposto de forma dissertativa,
apresentando tese, argumentação e conclusão.
Observe
que o vestibular avalia o corpo de carta, cujo conteúdo e linguagem atestarão a
capacidade discursiva do aluno, sua opinião, seus argumentos sua destreza
linguística.
Caso
o tema dado apresente como destinatário uma
autoridade ou instituição, o vestibulando deverá empregar o pronome de
tratamento adequado. Se for dirigida a um amigo, a linguagem poderá ser
simples, em razão da intimidade do autor com o destinatário.
O
candidato não deve assinar a correspondência, pois a redação no vestibular é
sigilosa. Lembramos que o destinatário e o vocativo são opcionais.
Na
lista abaixo, os principais pronomes de tratamento:
· Vossa
Alteza para príncipe.
· Vossa
Eminência para cardeal.
· Vossa
Excelência para deputado (federal e estadual), embaixador, general, governador
de Estado, juiz, ministro, prefeito, presidente da República, secretário de
Estado, senador, vereador.
· Vossa
Excelência Reverendíssima para bispo e arcebispo.
· Vossa
Magnificência para reitor.
· Vossa
Majestade para rainha, rei.
· Vossa
Reverendíssima para sacerdote.
· Vossa
Santidade para papa.
· Vossa
Senhoria para chefe de seção, diretor de repartição pública, funcionário
público (abaixo de ministro), major, oficiais até coronel, tenente ,
tenente-coronel.
Observe
que, utilizando qualquer dos pronomes de tratamento, o verbo deverá ficar na
terceira pessoa do singular, assim como os demais pronomes. Exemplo:
Vossa
Excelência poderá ocupar o
gabinete, tão logo seu pedido seja deferido.
|
No
modelo que se segue, temos uma proposta da Unicamp e a carta que a desenvolve,
selecionada pela própria banca da Universidade como exemplo de redação acima da
média.
Proposta
c
Trabalhe
sua carta a partir do seguinte recorte temático: O governo brasileiro tem
promovido campanhas de alcance nacional, a fim de combater o tabagismo, o uso
de álcool e drogas, a proliferação da dengue, do vírus da Aids e da gripe,
entre outras doenças que comprometem a saúde pública.
Instruções:
1.
Escolha uma campanha promovida pelo Ministério
da Saúde que, na sua opinião, deva ser mantida.
2.
Argumente no sentido de apontar aspectos
positivos da estratégia dessa campanha.
3.
Dirija sua carta ao Ministro da Saúde,
justificando a manutenção da campanha escolhida.
Campinas,18 de novembro de 2007.
Prezado senhor Ministro da Saúde
Escrevo-lhe com o
objetivo de parabeniza-lo por sua estratégia no controle da proliferação do
vírus causador da AIDS, a partir do programa de redução de danos. Sou uma jovem
estudante do Ensino Médio e, como tal, convivo diariamente com pessoas de
minha faixa etária. Por estudar em um colégio particular, tanto eu quanto
meus colegas dispomos de recursos financeiros suficientes para frequentar as
festas rotineiras, ocasionalmente comprando substâncias ilegais. Apesar de eu
me posicionar contra esse tipo de atitude, preocupo-me com meus amigos que,
ao priorizarem o “barato” e a diversão, esquecem-se das consequências letais
que seus atos podem trazer para suas saúdes; principalmente ao lidarem com
agulhas e substâncias injetáveis, propícios vetores de doenças como a AIDS.
Exatamente por
isso, concordo com a medida, autorizada pelo senhor, de distribuir seringas
descartáveis ou mesmo drogas, de forma a controlar a proliferação do HIV.
Além dos resultados bem-sucedidos, cientificamente, e de contar com países de
primeiro mundo como aliados nesta causa , o Ministério da Saúde mostrou estar
adequado ao
Princípio, ditado pela Constituição Brasileira, de que o
Estado deve ser o responsável por promover a Saúde.
Ao adotar esta
postura pragmática, o senhor mostrou não só estar ciente do problema que a
saúde pública enfrenta , mas também mostrou estar aberto a discussões que
preservem a saúde da população e, ao mesmo tempo, respeitem suas liberdades
individuais. Além disso, ao adotar uma
medida certamente “polêmica”, o Ministério está conseguindo atingir a meta de
conscientizar e persuadir a sociedade, que mostra-se interessada pela
inovação da técnica utilizada. A discussão
gerada é muito mais saudável que a negação da mesma, como noto entre
meus colegas, que adotaram a política do
governo, ao mesmo tempo que rejeitam a postura puritana dos americanos. Ao
aproximar-se da população , o senhor fez com que todos meditassem sobre o
assunto, a fim de que possam chegar a um consenso para a solução do problema.
Por isso, senhor
Ministro, parabenizo-o por uma política que está dando bons resultados. Se
meus colegas ainda não se desvincularam das drogas, ao menos têm a
consciência do desafio que é o combate à AIDS, graças ao canal de comunicação
aberto pelo governo. Isso demonstra um amadurecimento da sociedade diante da
responsabilidade da mesma quanto à manutenção da saúde. Assim como a campanha
de Oswaldo Cruz para a erradicação da varíola , no séc. XIX, o senhor mostra
que sua campanha de erradicação da AIDS é vanguardista e eficaz. Em meu meio
ela já foi aceita, portanto espero que seu sucesso atinja todos e perdure.
Atenciosamente,
F.T.S.
|
ANÁLISE
FEITA PELA BANCA DA UNICAMP
Nesta
carta, o candidato escolhe tratar da campanha de combate à AIDS, promovida pelo
governo, e argumenta a favor de uma estratégia específica , a da redução de
danos.
A
imagem do autor, ou melhor, da autora apresentada desde o início, é a de “uma
jovem estudante do Ensino Médio ”aluna de colégio particular, que convive com
usuários de drogas injetáveis. Percebe-se que a imagem não é gratuita, mas faz
parte da argumentação desenvolvida na carta em defesa da estratégia da
campanha, servindo como motivação e argumento de autoridade.
Na exploração do recorte temático, a autora
é bastante objetiva. Não apenas aponta os resultados cientificamente
comprovados da medida, mas ainda ampara sua implantação na responsabilidade do
governo, prevista na Constituição, pela saúde pública. O domínio da
complexidade do tema se evidencia, sobretudo, quando a autora destaca, como um
aspecto positivo da própria polêmica resultante da adoção da medida,
precisamente, a tematização de questões envolvidas, como a tensão entre liberdades
individuais e saúde pública.
Confronta um consequente amadurecimento da
sociedade que encara os problemas públicos com um puritanismo por parte de
países que rejeitaram a medida, e aponta
antecedentes históricos dessa postura no Brasil, associando o
vanguardismo da estratégia de redução de danos à Campanha de Vacina. A
argumentação termina referindo-se novamente à eficácia da estratégia em seu
meio, ou seja, lembrando da imagem da autora, a quem a convivência com o
público-alvo da campanha confere um conhecimento da causa. Com isso se percebe,
na redação, um uso apropriado da coletânea, integrando ao projeto de texto.
Alguns esparsos problemas de coesão e
impropriedade não impedem a leitura fluente e agradável dessa carta, em que a
imagem do interlocutor também é muito bem trabalhada. A cada parágrafo, o
discurso é dirigido, de cuja importância e manutenção a autora pretende
convencer.
Bom
estudo meus amores, com carinho de sua eterna Prof Dr Master Reikiana Aldry
Suzuki
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