domingo, 9 de setembro de 2012

Dificuldades e Distúrbios na Aprendizagem XI RESPEITO E EXIGÊNCIA





autora: Aldry Suzuki

3.4.11- Respeito e Exigência


            A situação é delicada, pois o professor precisa ser compreendido, precisa de “colo”, mas ao mesmo tempo deve ser chamado às suas responsabilidades, ter coragem de se rever, de assumir a parte que lhe cabe, se quiser superar esta infantilização a que foi submetido. Um dos critérios para se definir uma profissão é que os sujeitos que a abraçam possam ser responsabilizados pelo seu exercício.

            O contexto está extremamente difícil, complexo. No entanto, não devemos ver o professor através de uma representação lamentavelmente  muito enraizada: como um “coitadinho”. Ele é um ser contraditório, como outro qualquer. Ao levantarmos certas questões sobre a sua prática, corremos o risco de sermos encarados como inimigos, como se estivéssemos contra ele: sente-se culpabilizado pelo fracasso do aluno e da escola. É preciso, no entanto, falar das responsabilidades e, neste campo, com certeza, o professor tem uma parcela, ainda que absolutamente não exclusiva. É preciso falar de projeto, de compromisso, de mudança da realidade. E aí, mais uma vez, o professor que ainda não entregou os pontos tem uma importante contribuição a dar.


3.4.12 – Responsabilidade


            O restabelecimento dos objetivos e dos limites é tarefa de quem? Podemos ter aqui mais uma grave fonte de desvios: o famoso jogo do “empurra-empurra”. Quando se chega a este momento de ver o que fazer, há uma tendência de ficar esperando que o outro resolva o problema. Cada segmento tem  suas queixas e expectativas; se não forem devidamente explicadas e debatidas, podemos ficar “patinando”, num desgastante processo de acusa-acusa, em vez de ajuda-ajuda.

            Só a título de exemplificação, é muito comum ouvirmos dos professores a queixa de que os pais não estabelecem limites, não educam seus filhos com princípios básicos como saber se comportar, respeitar os outros, saber esperar sua vez etc., no que estão normalmente repletos de razão, já que muitas famílias não  estão objetivamente cumprindo sua função civilizatória básica . Por outro lado, vemos também a queixa de pais que estão sendo chamados pela escola para ouvir coisas do tipo: “Seu filho não está aprendendo; vocês precisam fazer alguma coisa”..., como se a obrigação de ensinar fosse dos pais. Para termos melhor idéia do que isto significa, pensemos no caso de a família levar o filho a um médico e este, depois de examina-lo, chamar os pais e dizer: “Ele está doente, precisa de alguém que entenda de saúde para poder ajuda-lo”... ora, quem é o profissional da Saúde, senão o médico? E, de forma análoga, quem é o profissional do ensino, senão o professor? Sabemos que estas afirmações podem causar espanto, mas é só para demonstrar o paradoxo a que chegamos: a escola sendo solicitada a fazer aquilo que seria obrigação dos pais, e os pais sendo solicitados a fazerem o que seria obrigação da escola... Se alguém tem dúvida disto, basta ver como estão progredindo as firmas de “aulas de reforço”... É óbvio que por este caminho de acusa-acusa não iremos muito longe. Mesmo no interior da escola, este problema também se manifesta na não menos famosa “síndrome de encaminhamentos do aluno”...

            Entendemos que o problema da disciplina é tarefa de todos: sociedade, família, escola, professor e aluno. Todavia não podemos ser ingênuos, pois, embora a  tarefa seja de todos, nem todos estão interessados em resolver o problema. O que fazer diante disso? Cruzar os braços e esperar que o outro faça a parte dele, para fazermos a nossa? Não. Até porque, se fizermos isso, nem teremos moral para cobrar do outro. Que atitude ter, então? Uma atitude transformadora, ou seja  começamos tentando fazer a nossa parte, somamos com os aliados da luta e vamos, ao mesmo tempo, cobrando que o outro faça a parte dele. É assim que estamos entendendo esse processo de mudança: que cada segmento assuma suas responsabilidades específicas – que são evidentemente diferentes – e exija que os outros também assumam suas respectivas, enquanto todos se  comprometem simultaneamente com a mudança das estruturas que estão por trás do problema.

            Sentimos necessidade de apontar para a mudança de enfoque: em vez de culpa, é preciso falar de responsabilidade. A culpa, por ser de “fora para dentro”, leva ao julgamento e à atitude de defesa, de transferência, de procurar jogar novamente para fora, buscando outro culpado; a preocupação maior acaba ficando em achar o culpado e não em resolver o problema. A responsabilidade, por ser algo mais de “dentro para fora”,chama para a ação, para o compromisso com a superação.

            A sala de aula e a escola não estão desvinculadas da problemática do resto da comunidade e da sociedade, porém têm sua autonomia relativa.

            De imediato, eu não tenho condições de mudar as pessoas e/ ou o mundo; entretanto, de imediato, eu posso mudar a maneira de me relacionar com as pessoas e com o mundo! Isto não é tudo, mas é um passo importante e de minha responsabilidade!!


3.4.13 – Perspectivas de Ação


            O que fazer?? Voltamos agora à pergunta inicial, só  que melhor equipados para poder responde-la. Antes, contudo, uma  observação sobre a questão do discurso e da prática.


3.4.14 – Plasticidade do Discurso X Rigidez da Prática


            Assusta muita esta coisa de como a escola não muda, ou muda muito lentamente. O discurso educacional tem mudado com uma velocidade incrível, mas prática... Um dia fomos tradicionais, logo depois modernos e depois tecnicistas, depois libertadores, e histórico-críticos, crítico-sociais do conteúdo, construtivistas, socioconstrutivas, pós-construtivistas, co-construtivistas, interdisciplinares, transdisciplinares, qualidade total, holísticos, etc. A cada dia é uma novidade que chega. O que poderia representar um ganho, se fosse apropriado dentro de um quadro de referência maior, com uma visão crítica etc., acaba-se tornando mais uma moda... Esta incorporação no discurso é um desafio, pois tira o eventual caráter transformador das idéias, já que não vem acompanhada de uma ética, de um compromisso com a efetiva mudança da realidade. ?Sabemos que, muitas vezes, isto pode até funcionar como estratégia de sobrevivência dos professores, ante as exigências equivocadas das equipes diretivas: a direção ou coordenação sai para fazer um cursinho de 40 horas e já  volta dizendo que “agora vamos seguir tal linha”...

            Precisamos estar atentos a este maldito formalismo na Educação: “Ah, agora é para fazer avaliação diagnóstica etc.? Deixa com a gente”. Está tudo resolvido formalmente, contudo a prática continua como antes...

            O questionamento que poderia ser proposto aqui é: será que precisamos de uma nova relação de idéias sobre a realidade ou uma nova relação com as idéias e com a realidade? Tomar algumas idéias, alguns princípios, acreditar, ir fundo , tentar colocar em prática, refletir sobre os resultados, reformular etc., constituir uma autêntica práxis pedagógica.


3.4.15 – Sentido e Exigências


            A partir da análise feita anteriormente, fica patente que a tarefa de construir uma nova disciplina passa pelo restabelecer o sentido para a escola, para o estudo, bem como pelo restabelecer os limites. Só que aqui, em lugar de falarmos simplesmente de limites, vamos falar de exigências, o que inclui os limites, mas também as possibilidades, com freqüência esquecidas; isto é importante para não cairmos numa disciplina meramente restritiva, do “não”, “não” e “não”.

            Muito sinteticamente, apontamos a seguir algumas possibilidades de os vários agentes contribuírem para a construção  de uma nova disciplina em sala de aula e na escola.


3.4.16 – Resgate do Sentido


   Construir participativamente o projeto político-pedagógico da escola, resgatando o sentido do estudo, do conhecimento.

   Ganhar clareza em relação à postura do educador: dialética direção-participação.

   Ter convicção daquilo que vai ser ensinado.

   Resgatar a significação dos conteúdos.

   Realizar trabalho de conscientização com as famílias.

   Explicitar o sentido das normas existentes(e que neste momento não estão em discussão).

   Superar o formalismo, a burocracia, a alienação das relações.

   Ajudar a fazer a leitura crítica dos meios de comunicação.

   Famílias ajudarem filhos a refletirem sobre sentido da existência.

   Buscar valorização efetiva da Educação e de seus profissionais.

   Comprometer-se com a construção de uma nova ética social.


3.4.17 – Sentido para o Estudo


            Entendemos que a questão do próprio sentido do trabalho pedagógico é a contradição nuclear hoje na Educação. Se o professor não acredita, se não vê o sentido do que faz, se diante daquela pergunta do aluno: “professor, estudar para quê??”, não consegue dar uma resposta, se o próprio professor não sabe o que está fazendo ali, todo o resto, toda a elucubração sobre a necessidade de limites fica comprometida. Porque, como vimos, o limite só tem sentido se for articulado a um objetivo. Então, antes de saber para que estudar oração subordinada substantiva, o aluno tem de saber para que estudar. Esse aspecto é da maior importância. O próprio professor resgatar o sentido do trabalho. Pensar sobre a sua prática. “o que é que estou fazendo aqui?? Eu acredito no que faço? E ter coragem de tomar uma posição. Então, o primeiro ponto é o resgate do sentido da tarefa educativa: compreender o conhecimento como instrumento de transformação. Resgatar o sentido do conhecimento. Conhecer para quê? Par  poder compreender o mundo em que vivemos, para poder usufruir dele, mas sobretudo para poder transforma-lo!! Isto implica o professor tanto se compreender como sujeito de transformação, quanto ter clareza de que está  participando da formação dos novos sujeitos de transformação. A nosso ver, se não acreditamos na possibilidade de transformação da realidade, não deveríamos estar no magistério, pois ser professor é essencialmente acreditar na possibilidade desse vir-a-ser”.

            Há o perigo de, diante da falta de sentido, cairmos no jogo atual da competição: estudar para ser o melhor, para passar na frente dos outros, para poder garantir o seu lugar. Ao invés de caminharmos para a superação, reforçamos a lógica de exclusão.

            É preciso apontar para a possibilidade da escola como elemento de mudança das relações sociais, de tal forma que se possa voltar a ter esperança de um futuro melhor. Ou será que a escola nada pode diante de um”destino” previamente traçado para o aluno e para a humanidade? É obvio que não de forma ingênua, como no passado, quando acreditávamos na escola como “redentora da humanidade”, desvinculada do resto da sociedade.

            Com o avanço assustador das forças produtivas, através da recente revolução da microeletrônica e d informática, que permitem  automação flexível, estamos colocados diante de um desafio enorme: simplesmente recriar as formas de organização do trabalho, as relações humanas, a cultura, uma vez que a as condições para reprodução material da vida estão dadas potencialmente; todavia, ao mesmo tempo, estão aprisionadas num modelo ultrapassado de organização social, gerando uma contradição fundamental. Isto deve-nos  remeter a solicitar o melhor de cada um e de todos nós: usar o conhecimento, a criatividade para encontrar alternativas.

            O professor – não o “dador” de aula – trabalha com a produção do sentido. Hoje, diante do clima de perplexidade do mundo, as pessoas estão procurando ansiosamente sentido para as coisas. É , portanto, o tempo por excelência do  autêntico conhecimento, do verdadeiro mestre e do estudo na sua perspectiva radical.



Prof Dr Master Reikiana Aldry Suzuki

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