Autora : Aldry Suzuki
III – INDISCIPLINA EM
SALA DE AULA E NA ESCOLA
É um grande desafio que os
educadores têm encontrado em relação à indisciplina em sala de aula e na
escola, tanto na pública como também na particular, todavia com manifestações
diversas. Sabemos também que não se
trata de um problema apenas brasileiro, apesar das pecularidades encontradas
aqui; temos relatos por exemplo, de gangues estudantis que têm batido nos
professores na França,São Paulo até em Barbosa... do alto número de mortes públicas
(brasileiras e americanas) fruto da violência, das conseqüências nefastas da
rígida disciplina japonesa, levando ao suicídio e à falta de criatividade.
Esta questão tem
ocupado um espaço cada vez maior do cotidiano escolar no País. É grande também
a insatisfação daí decorrente, chegando até a se constituir em causa de
abandono do magistério. Houve época em que a reclamação partia de professores
da 5ª ou 6ª série; depois começou a vir dos de 3ª e 4ª , sendo que atualmente
tem vindo até dos que lecionam na Pré-escola... Gostaríamos de deixar claro que
não estamos generalizando, mas procurando apontar uma tendência, que é
preocupante e precisa ser revertida.
3.1 - RUMORES DOS PROFESSORES
“A falta de interesse está muito
grande. Os alunos estão dispersos, não respeitam mais o professor, estão
vivendo em outro mundo. A tecnologia avançou demais e o professor infelizmente
não acompanhou, ficou desinteressante para eles. Eles estão acostumados a
apertar botão de videogame, de computador, a ver televisão e aí aparece o
professor com apagador e giz... O professor não está conseguindo ter domínio,
as aulas estão muito no passado, muito antigas. Os meios de comunicação ao
invés de ajudar estão atrapalhando: programas muito violentos. Não está
existindo liberdade com responsabilidade. As crianças de hoje são mais espertas
do que antigamente. A família não tem colaborado; os alunos vêm sem limites de casa. Geralmente há
até conivência dos pais: o professor nunca tem razão. Há muitos problemas
familiares. A própria família não sabe o que fazer; a mãe fala: ‘o que eu faço
com ele? Vou matar?. A disciplina em sala de aula extrapola totalmente e aí não
tem jeito, só se bater e bater não pode. Eu não sei o que fazer com a classe.
Tem hora que dá vontade de bater em todo mundo. Ás vezes, o professor é
completamente ignorado na sala de aula ; você entra e parece que não entrou
ninguém. Por que se dá tanta regalia para os alunos e o professor é tão
esfolado em sala de aula ? Como manter uma aula decente se você não tem material pedagógico, não tem
condições de trabalho, não tem nada? Você vai tentar punir o aluno, não pode
porque a direção não deixa, o Estado não permite, os pais não permitem... Há
também a indisciplina social. Há muita impunidade na sociedade: as pessoas
fazem coisas e não acontece nada com elas. Falta perspectiva ao jovem: não sabe
para que estudar. Aluno diz:’eu vou ser jogador de futebol, não preciso de
estudo’.vai ganhar muito mais do que eu... às vezes, muitos de nós,
profissionais da área, ficamos desmotivados pois o professor não ganha tão bem.
O professor também se desmotiva: ‘Ah, para que eu vou mudar? Para que fazer meu planejamento assim? Ah, uso o do ano passado’. O que fazer
quando aluno desrespeita muito o professor e depois diz assim:’não me amole que
hoje eu já fumei maconha?’ Como explicar que a classe é disciplinada com
determinado professor e não é com outro?
É preciso ver a postura do professor, o método que utiliza. Continuamos com
métodos elitistas e arcaicos. O que é para nós disciplina? É a prática do silêncio ? “
Podemos perceber alguns focos da
queixa: o aluno, seu desinteresse, decorrente da tecnologia a que tem acesso
fora da escola; os meios de comunicação, a sua
influência negativa; a família, não cumprindo seu papel; a escola, que
não apóia o professor; a sociedade, sua (des) organização; e, depois de um
certo tempo, chega-se a colocar em questão a própria relação pedagógica.
Só por este breve levantamento,
podemos ver como o problema da disciplina está ligado a uma série de outras
questões; não dá para falar de disciplina de uma forma isolada em relação à
realidade maior.
3.2
-DIFICULDADE
A questão da disciplina pede,
para seu enfrentamento, a ajuda de um conjunto de áreas do conhecimento, como a
Sociologia, Antropologia, Psicanálise, Ética, Política, Psicologia, Economia,
História, Tecnologia, Comunicação Social, além dos próprios saberes pedagógicos. Outro fato as ser considerado é que a disciplina é
apenas um aspecto do processo de educação escolar, que por sua vez também é
extremamente complexo e exigente, uma vez que se trata de participar da
formação, ao mesmo tempo, de trinta, quarenta ou mais sujeitos. Que outra
atividade humana apresenta tal nível de dificuldade?
O “único” problema do professor é
que lê é um sujeito concreto – não é anjo, um ser abstrato -, que trabalha com alunos também concretos, numa
realidade concreta; se não fosse isto, tirando a concretude do real, seria superfácil
ser professor, mas aí também não haveria necessidade de sua existência...
Temos uma clareza: ser “mediador” de
aula, “uma tia” que toma conta de aluno é fácil, mas ser professor, no seu
sentido radical, não é fácil não. Por isto o professor precisaria ser muito bem
formado (como os alunos do curso CND – IESDE)
e muito valorizado.
3.3 - PAUSA
PARA REFLEXÃO (Limites e Possibilidades)
De certa forma, o
professor “já sabe” o que deve fazer: em algum momento de sua vida já ouviu
falar ou vislumbrou uma possibilidade de como deveria agir. No entanto, muitas
vezes, não o faz. Por quê?
a)
Não acredita mais profundamente, não está convencido:
Da proposta em si – não tem segurança de que seja o caminho certo;
Da eficácia da proposta – acha que talvez seja muito pouco em relação ao
tamanho do problema, que não vai resolver.
b)
Não sabe como fazer; uma coisa é ter ouvido falar,
outra é ter competência para colocar aquilo em prática.
c)
Não vê condições de fazer:
Seja efetivas (fruto de uma análise mais criteriosa da realidade);
Seja fruto de sua percepção, sem muita base no real.
O fazer do sujeito depende do querer
e do poder, que se relacionam dialeticamente, já que, por exemplo, o não ver
possibilidade acaba diminuindo o desejo de fazer. O poder, por sua vez, tem uma
base objetiva, que são as condições mínimas para a ação; e uma base subjetiva,
que é o saber fazer. Há também aqui uma relação entre estas dimensões, uma vez
que a base objetiva pode ser alterada justamente pela ação consciente do homem,
portanto orientada pela base subjetiva.
Qual seria, então, o papel da
reflexão?
Procurar
resgatar o professor como sujeito, seu desejo, projeto, sentido, querer;
Desmontar alguns
mitos que funcionam como obstáculos epistemológicos;
Apontar alguns
caminhos, alternativas, que estejam ao seu alcance (não algo “estratosférico”),
em termos tanto de processo,
quanto de propostas de ação.
O problema da indisciplina esta
angustiando cada dia mais os educadores em geral e os professores em
particular. A grande pergunta que está na cabeça de todos é: o que fazer? Embora
esta questão seja da maior importância e deva ser respondida, entendemos
que, outras duas devem ser enfrentadas: o que está acontecendo? É comum
ouvirmos o seguinte: “já sabemos em qual é o problema, até porque o
sofremos na pele. Queremos é solução”. No entanto, o que temos observado é que
padecemos, mas não compreendemos o problema; no trabalho científico costuma-se
afirmar que definir bem o problema é já ter 50% da solução...
3.4
- SINOPSE DA REALIDADE
O que está acontecendo? Como
entender a questão da indisciplina escolar? O que está por trás da manifestação
do problema ?
3.4.1 - Tentar compreender o que está acontecendo
Antes de mais nada, é preciso
compreender que houve profundas mudanças na escola, na sociedade e nas suas
relações. Parece difícil aos educadores darem-se conta disto. O saudosismo ou o
espírito de acusação estão muito fortes no cotidiano da escola. Agredidos,
procuram inconscientemente algum alvo onde possam descarregar suas mágoas, suas
incompreensões...
Sempre que pensamos em disciplina,
logo nos vêm à mente as idéias de limites (restrição, frustração, interdição,
proibição, etc.) e de objetivos (finalidades, sentido para o limite colocado).
A nosso ver, a crise da disciplina escolar hoje está associada justamente à
crise da disciplina escolar hoje está associada justamente à crise de objetivos
e de limites que estamos vivenciando.
3.4.2 –
Alteração de sentidos
Do ponto de vista dos objetivos, há
uma alteração geral de projetos, de sentidos para as coisas, em nível tanto
mundial quanto nacional, tanto institucional quanto pessoal, tanto ideológico
quanto sociopolítico-cultural. Há um sentimento generalizado de “geléia geral”,
que se manifesta na desconfiança em relação à razão, no “fim da história” e das
utopias, no “salve-se quem puder”, no “procure curtir ao máximo a sua vida já”
etc...
Na escola, esta crise se manifesta
de muitas formas, mas com certeza uma das mais difíceis de enfrentar é a
absoluta falta de sentido para o estudo por parte dos alunos. A pergunta
“estudar para quê”, nos parece, nunca esteve tão forte na cabeça dos alunos
como agora. A famosa resposta dada por séculos, “estudar para ser alguém na
vida”, chega a provocar risos nos alunos, ante a clara constatação de inúmeras
pessoas formadas, porém desempregadas ou muito mal remuneradas. Estamos vivendo
a queda do mito da ascensão social através da escola !! Como entender isto ?? O
esquema a seguir procura sintetizar a mudança
que ocorreu nos últimos anos:
CRESCIMENTO
DOS DIPLOMADOS
MAIS ALUNOS
FORMADOS
RESULTADO:
Mais alunos com diploma na mão e desempregados!!!
|
QUEDA DA
NECESSIDADE DE MÃO DE OBRA QUALIFICADA
MENOS EMPREGOS
|
Este sentido extrínseco ao processo
pedagógico foi a tábua de salvação de muitos professores: os alunos não viam
sentido no que estavam fazendo, mas tinham em mente a perspectiva de uma
recompensa mais tarde. Este era o “projeto educativo” de milhares de
educadores. Hoje, os alunos continuam não vendo sentido nas práticas de sala de
aula, e não vislumbram mais um futuro promissor pela via do diploma. O
professor que baseava sua autoridade neste mito está perdido. E, o que é pior,
não tem conseguido articular outro sentido para o conhecimento, a escola, o
estudo.
A escola ficou protegida de suas
contradições internas por muito tempo em função de sua relação de “parceria”
com o mercado de trabalho. Esta motivação extrínseca – já que não estava
ancorada na própria relação pedagógica – encobria e tornava “suportável” o que
lá acontecia, tendo em vista o prêmio posterior (“Sofro agora, mas depois terei
um bom emprego, serei alguém na vida”). Estamos diante do autêntico problema,
que não é absolutamente novo, mas que agora – finalmente, nos parece – tem de
ser enfrentado...
Esta situação em que vemos muitos
professores alienados, fazendo o que lhes mandam (“tenho de cumprir o
programa”, “Tenho de dar tarefa, senão os pais reclamam” etc), não deveria nos
surpreender, pois é justamente isto que a escola vai ensinando desde cedo aos
seus alunos: obedecer sem questionar !! (e o professor foi aluno por muito
tempo e para ter “sucesso” provavelmente teve de se submeter às regras do
jogo). No atual momento, quando os alunos passam a se rebelar, alguns
professores parecem meio indignados, traídos: “Ué, podia fazer isto?? Por que
não fizemos no nosso tempo?? Por que obedecemos passivamente?? Por que
engolimos os “sapos” ??”. Parece haver uma sutil inveja do professor em relação
ao seu aluno, que agora contesta, questiona, busca o sentido das coisas...
Este “estouro” do problema
disciplinar na escola é, com certeza, um sinal, que precisa ser decodificado,
entendido.
Prof Dr Master Reikiana Aldry Suzuki
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